“A vida é feita de escolhas. Quando você dá um passo à frente, inevitavelmente alguma coisa fica para trás”. Mais que uma síntese da vida real, a frase viral, atribuída ao jornalista e dramaturgo Caio Fernando Abreu, parece resumir o enredo de Vidas Passadas, longa sul-coreano que estreia nesta quinta-feira (24/1), dias após ser anunciado como um dos concorrentes ao Oscar 2024 de Melhor Filme.
Dirigida pela estreante Celine Song e protagonizado por Greta Lee e Teo Yoo, Vidas Passadas conta uma história sensível, de amor e desencontros, introduzida pela brincadeira de dois personagens invisíveis em um bar. Sentados e atentos à conversa de um trio que está em outra mesa, eles questionam: “Quem será que eles são um para o outro?”.
Minutos depois, o público entra em uma cápsula do tempo para conhecer Norah e Hae Sung — dois dos personagens do bar. Eles se apaixonam na Coreia do Sul, durante a pré-adolescência, e mantêm uma relação cheia de significado até a mudança da família dela para o Canadá.
Anos mais tarde, se reencontram nas redes sociais e são inundados pelo primeiro amor romântico e infantil que deixaram para trás e passam dias e noites se adaptando ao fuso horário para conversarem um com o outro pela internet.
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É a partir daí que o bilhantismo de Song na direção fica evidente. A cineasta conduz cada cena com maestria, apontando em diálogos simples e com silêncios profundos, capazes de transportar o espectador para o quarto de um dos protagonistas — ou de volta a alguma experiência pessoal que encontra familiaridade com o enredo.
Separados pela distância geográfica e os horizontes profissionais, eles decidem se distanciar mais uma vez, em uma cena melancólica, interrompida por uma sequência que sugere novos rumos à vida dos dois.
Alerta spoiler: se você não quer um, pare por aqui
Doze anos depois, Norah, agora casada com Arthur (John Magaro), conta que o amigo de infância está com férias marcadas para Nova York, onde o casal mora. Do outro lado do globo, o espectador acompanha o conflito de Sung entre a expectativa de rever o antigo amor pela primeira vez enquanto tenta parecer indiferente à realidade imposta por anos de distância.
Já Arthur passa a conviver, de maneira elegante e honesta, com a insegurança de que a esposa abandone a vida construída pelos dois para dar uma chance à história com Hae Sung.
Mas o roteiro não conta com grandes reviravoltas e talvez seu mérito esteja justamente aí. O primeiro abraço de Norah e Hae Sung é sutil e emocionante como o que ocorre minutos mais tarde, quando a personagem retorna para casa aos prantos após dar adeus ao amigo mais uma vez e ser acolhida marido. Sem ceder ao clichê, Norah lamenta estar longe de Sung e sua cultura, mas entende que “algumas travessias custam uma vida inteira”.
As escolhas certeiras da diretora, performance do elenco assim como o roteiro, bem escrito e atento às sutilezas, fazem do longa um concorrente de peso à estatueta mais cobiçada do Oscar 2024. Mesmo que não leve, é uma obra que merece ser vista e deixa claro que a jovem Celine Song ainda tem muito a mostrar para o cinema mundial.
Avaliação: Ótimo